
BOTEQUIM
Revista de Opinião, Artes, Letras, Tendências
"NÃO PAGAMOS"
O dono de vários grandes super-mercados, em entrevista, acusouca classe política de viver na babugem dos impostos.
Mas não disse que ele vive à conta de margens de distribuição e do esmagamento dos produtores nacionais. Para tal dono, a solução está na isenção total de IVA em bens essenciais. E pronto.
Nem revelou que os impostos da sua empresa são pagos no Países Baixos, por ser mais barato.
Também não aflorou o valor do seu ordenado superior em 280 vezes o salário mínimo
do seu empregado mais simples.
Esqueceu-se ainda que, nos dias de hoje, 75 por cento da nossa comida é distribuída por hipermercados, que assim asfixiaram o comércio local.
E também que os trabalhadores dos hipermercados estão a ser substituídos por máquinas de self-pagamento.
Devíamos era seguir Dario Fo na sua peça teatral e gritar bem alto:"Não Pagamos, Não Pagamos".
Só pagaremos impostos na Países Baixos e não compraremos comida em hipermercados.
E seria possível?
Com 75 por cento da nossa alimentação na mão dos hipermertcados... Não.
M. Castro




'É como eu aponto as coisas'.
Cozinheiro compulsivo da família, em casa alheia trato de ajudar no que fôr preciso mesmo que a cozinha da vizinha esteja mais suja que a minha.
Há dias deitei ao lixo lixo que nem era meu: latas de conserva, gargalos de iogurte, voltarenes encarquihados, rolos de papel higiénico sem destino, sacos secos de chá, resquícios de ovos mal cozidos e lascas de sabonete. E diz-me horrorizada a dona da casa: 'atiras à rua a minha lista de compras?!'.
Diz que há gente assim e eu nem sabia: a que nos pede uma lista escrevinhada ou a fixa no telemóvel para melhor ir às compras e aquela outra que deixa pedaços de lixo ao lado do fogão, a meio caminho do caixote, para se lembrar daquilo que tem de voltar a comprar.
Aprendi a lição. Hoje de manhã vi cascas de cebola no chão da rua e pensei: 'ora gaita, que alguém seesqueceu do bloco de apontamentos'.
O homem mais perigososo... na mira dos melhores cartoonistas

Trump é hoje a figura central de um novo mundo estranho. Os geniais cartoonistas deliciam-se e deliciam-nos

Q
Quando um gato afia as unhas num livro

O meu gato adora livros, como Natália Correia gostava de gatos, soube eu através de um amigo. Umberto Eco também tinha um gato.
O autor do 'Pêndulo de Foucault' forrou as paredes da sua casa com estantes, onde o seu gato afiava as unhas, de certeza. O meu já fez isso. E eu achei graça. Gosta de livros!
Confidencio: o meu gato teria o nome de Marx, uma graça, mas isso faria comichões às minhas visitas, por causa das sensibilidades políticas. E ficou Max!
O meu Max adora a entrada do prédio, não para meter conversa, mas para receber carinhos. Há dias sentei-me ao lado dele, no degrau de entrada, e recebemos apenas três boas tardes em doze passagens de vizinhos. E carinhos? Nada.
Apoucam-nos por saberem dos gostos do Max por livros; ou então por eu ser amigo de um gato... ´vira-latas dele´.
O Max nem ligou e eu, ao seu lado, continuei com o Eco, semelhante a Fernando Campos em 'A Casa do Pó'. Mas poucos poucos passaram cartão ao português.
Talvez, se fossemos 'francius' ou 'camones' fosse diferente.
Por cá as estrangeirada teve sempre palmas, desde pai de Afonso, importado da Borgonha, há 800 anos.
JM



PUTIM É SÁBIO E BONDOSO
Trump, Putin, Israel, Ucrânia e sobretudo Gaza são temas banalizados e infelizmente perigosos para qualquer cidadão de qualquer país falar, desde logo por razões de segurança pessoal.
Mas aconteceu um golpe de magia nunca visto. O senhor Putin apareceu agora, pasme-se! como um homem bondoso e sábio.
Ele explicou a Trump a história da Gronelândia. E também ficou triste por Trump não aceitar a sua proposta de tropas das Nações Unidas na paz em breve na Ucrânia. Nem mais!
Se John Le Carré fosse vivo mudaria o nome de Agente Smiley para Agente Putin, logo em "A Chamada para a Morte". E faria também uma reviravolta total no enredo do belíssimo livro"A Gente de Smiley".
Alexandra Gilkman voltava feliz para a Rússia, abraçando o pai às gargalhadas. E o general Oleg Kirov metia-se a cuscar pessoas para permitir a entrada de espiões na Rússia, sob cobertura de biografias falsas. Tudo ao contrário do que lemos durante anos.
AS DUAS PERGUNTAS DE PUTIN
Com apenas duas pequenas aparições, Putin obrigou-nos a duas perguntas graves:
Se os EUA querem a Gronelândia e o Canadá, porque razão os russos não podem ter de volta a Crimeia, que foi russa por centenas de anos?
Mais, porque razão se pode condenar a Rússia ao bombardear ´dia-sim-dia-não` a gigantesca Ucrânia com drones-bombas, se os israelitas (com o apoio claro americano) bombardeiam 'dia-sim-dia-sim' Gaza, uma faixa de um terço do tamanho do Algarve?
Já nem falamos da Rússia ter morto num dia dez ucranianos, enquanto no mesmo dia (quebrando unilateralmente tréguas) um só ataque israelita matou 400 palestinianos. Claro que tanto faria um como mil, mas não faz!
Estamos a viver tempos de barbaridades sem limites.
E uma parte dos livros escritos com dedicação por John Le Carré tornou-se uma enorme incongruência. Não é possível rescrever a História, mas a História pode rescrever os nossos livros.
josé ramos e ramos
Antecipações
Um dia perguntaram a Natália Correia a razão de abrir o Botequim e não, por exemplo, uma galeria, uma livraria, uma editora; rápida, ela respondeu que quis criar nele um espaço que antecipasse um Portugal a haver no futuro, um espaço de cultura, de ideias, de convívio, de afectuosidade.
O Botequim foi-o plenamente, marcando a segunda metade do século XX português. Nunca houve, nem por certo haverá, nada igual entre nós.
Para a autora de "Sonetos Românticos" a cultura não deve ser desvivenciada pois só quem está muito na vida a pode recriar e transmitir. Entendendo a poesia como profecia (poeta significa profeta), surgiu do futuro atravessando o passado, sonhou realidades concebendo ficções.
Fernando Dacosta
